Como crescer um business de serviços do zero – uma breve história sobre como pegamos tração na Eyso

Em 2013, fundei a Eyso com dois amigos. Fomos a primeira empresa brasileira de Otimização de App Store – uma das dez primeiras do mundo.

Demo Day da Eyso no Google em São Paulo - Luis Specian, Ludmilla Veloso, Romulo Gomes, Guilherme Brito

Apresentando a Eyso no Demo Day @ Google São Paulo – 2014

Naquele ano:

– O iPhone 5 era o mais novo do mercado;

– O Android alcançou 75% de market share – vindo de 50% no ano anterior;

– Minha esposa e eu nos tornamos pais (hoje essa mocinha que agora vira-e-mexe exige aparecer nos meus posts de vez em quando – é mole?!)

Se você nunca ouviu falar em ASO, pode pensar nisso como o SEO dos Apps: em vez de tentar rankear sites nos resultados de busca do Google, otimizamos nossos aplicativos para a App Store e Google Play. A lógica é a mesma.

Nosso plano na Eyso era simples: vender serviços de ASO, pegar essa grana e usá-la para construir nossa ferramenta. Simples, certo?

Apesar termos muita tração no lado do serviço do negócio, não conseguimos criar o SaaS que tanto queríamos. Acabamos por então encerrar nossas operações no final de 2015. A parte boa é que a gente conseguiu resolver um grande problema que você provavelmente já enfrentou – ou vai enfrentar – em algum momento da sua carreira: como criar demanda por algo que quase ninguém ouviu falar antes.

Lembrando aqui de novo que estamos falando de 2013.

Naquela época, a maioria das pessoas pensava que a gente era um bando de pessoas estranhas quando falávamos do tal do ASO. As conversas costumavam ser assim:

Eu: “Os apps X, Y, e Z conseguiram 10x seus downloads apenas ajustando suas palavras-chave, título, anúncio otimizando suas capturas de tela. Nós ajudamos eles a ter esses resultados. Talvez a gente possa fazer o mesmo para o seu aplicativo também.”

Cliente em potencial: “Sim… Claro. Desculpa, eu tenho que ir. Eu preciso ir para casa cuidar do meu peixe.”

>> Aliás, você sabia que tenho um curso de ASO disponível on demand? <<

E haviam outros problemas:

  1. O SEO estava passando por uma fase ruim, onde as pessoas o viam como um monte de táticas obscuras (não me lembro exatamente por quê);
  2. Eu não era especialista em ASO, embora estivesse confiante em transferir minhas habilidades de SEO para essa nova área. Eu tinha otimzado um app só até então com ótimos resultados, e também conhecia esse cara – Saulo Arruda – que cresceu seus downloads em 40x para o seu aplicativo de sons de peido (sério, era essa a história que a gente usava. Pensando bem, acho que ta explicado porque achavam que a gente era maluco);
  3. Meus sócios e eu não tínhamos histórico de construir um negócio desses.

Por que alguém confiaria em nós, então?

Bem, a gente nunca pensou nisso dessa maneira, na verdade.

Nossa linha de pensamento foi: nós já vimos como essa técnica nova é poderosa. Estamos confiantes de que isso será um mercado de bom tamanho logo logo. E o fato de a maioria das pessoas não saber que ASO era uma vantagem e não uma fraqueza.

Isso é o mais importante: estávamos apenas confiantes em nossa capacidade de aprender essa coisa e levá-la ao mercado. Era isso.

Embora não tenhamos conseguido construir um SaaS, criamos com sucesso um negócio de serviços/consultoria. E essa é a parte da história que estou trazendo para vocês hoje.

A Eyso é o principal motivo pelo qual a OLX decidiu me “importar” do Brasil para Portugal; É por isso que trabalho para a Afya hoje em dia (PEBmed, uma de suas empresas, foi um dos nossos dez primeiros clientes); Foi assim que conheci meus melhores amigos e parceiros de negócios; Foi assim que juntei know-how para lançar meu primeiro curso autoral; Foi assim que eu soube que havia uma oportunidade de criar a Easy App Reports.

Construir o Eyso foi de longe a coisa mais desafiadora que já fiz na minha carreira. Eu me sentia preocupado, estressado e confuso a maior parte do tempo. Mas, de alguma forma, também foi uma das experiências de trabalho mais gratificantes de todos os tempos.

“One day, in retrospect, the years of struggle will strike you as the most beautiful.” – Sigmund Freud.

 

De volta para o futuro

Dois anos depois, tínhamos mais de 30 clientes, gerando milhões de downloads orgânicos para eles. O boca a boca estava finalmente pegando. Nosso pipeline estava sempre recebendo novos leads constantemente.

Estes são os passos de alto nível que seguimos para ir de Zero a Herói:

  1. Reduzimos nossos preços para obter nossos primeiros três a cinco clientes
  2. Rebranding nossa oferta e tornando nossos casos mais modestos
  3. Obtendo nosso primeiro grande cliente
  4. Construir uma história de sucesso para cada projeto que já trabalhamos
  5. Máquina de construção e aquisição
  6. 10x nosso preço usando preços baseados em valor

 

**NOTA IMPORTANTE**

É fácil olhar para trás e juntar as peças como se tivesse tudo sido meticulosamente planejado. Algumas coisas realmente foram, outras nem tanto. Muitas vezes tivemos que improvisar. Recomendo ler esse artigo como inspiração, mas não como uma receita de bolo.

 

#1: Reduzimos nossos preços para obter nossos primeiros três a cinco clientes

Ao invés de cobrar R$ 2.500/mês, que acreditávamos ser o preço justo por nossos serviços, reduzimos para R$ 950 para atrair os primeiros clientes.

eyso sticker on a carNossos principais canais de aquisição eram grupos do Facebook e LinkedIn sobre App Marketing, Meetups e boca a boca de amigos que acreditavam em nós. Íamos na caruda mesmo abordar as pessoas e oferecer nossos serviços.

Depois de conversar com nossos primeiros potenciais clientes, descobrimos que muitos fundadores de apps estavam se lançando sem nem mesmo saber o que poderiam fazer para aumentar suas chances de sucesso. Então criamos um “pacote de lançamento”: o primeiro conjunto de título, palavras-chave e descrição, além de orientações sobre suas capturas de tela – tudo pelos tais R$ 950.

Funcionou: conseguimos fechar o primeiro aplicativo para o qual apresentamos este pacote, aliás. O aplicativo se chamava Fashion85. Eu não podia acreditar o quão fácil tinha sido fechar aquele negócio. Nessa época estávamos na Germinadora ainda, validando o negócio, e essa primeira venda mudou tudo.

Depois desse primeiro, fechamos mais alguns no mesmo formato: abordando clientes diretamente nos eventos e oferecendo o tal pacote. Foi uma fase bem difícil, a maioria não queria nem conversar com a gente – mas depois de algumas semanas persistindo começamos a fechar um ou outro.

Durante os próximos dois anos, ainda continuaríamos usando essa estratégia para conseguir espaço em clientes mais resistentes à ideia de fazer ASO. Uma vez que o lançamento foi feito e os resultados surgissem, nós fazíamos upsell para o serviço recorrente durante 3 a 12 meses, em média.

 

#2 Reformulando nossa oferta e tornando nossos cases mais modestos

No início, lançamos nosso serviço como “SEO para aplicativos”.

Era a coisa mais óbvia que podíamos fazer: dar um nome familiar a algo que soava muito estranho para a maioria das pessoas. Mas… Não poderíamos estar mais errados na nossa hipótese.

Este teste falhou miseravelmente já enfrentamos um problema mais sério: o SEO estava passando por uma pequena crise. Muitos fundadores acreditavam que isso era só um monte de hacks de curto prazo que não durariam muito. Isso somado ao fato de que os resultados que costumávamos destacar pareciam bons demais para ser verdade, estava dificultando nossa vida.

No exterior, percebemos que outros players estavam usando o termo App Store Optimization. Decidimos adotar e levar isso ao mercado.

Embora os clientes não conhecessem o termo, percebemos que eles estavam muito mais receptivos a ele. A nova nomenclatura dava a sensação de ser algo como um segredo de mercado, algo que a maioria das pessoas ainda não conhecia. As empresas maiores continuavam rejeitando a gente, mas as empresas mais novas estavam bastante abertas para ouvir sobre as nossas ideias.

Ainda usávamos a analogia do SEO com frequência para explicar o que era, mas reforçavamos que era um jogo diferente, com outras regras.

Também ajustamos o pitch das para que as nossas histórias de sucesso soassem um pouco menos espetaculares, para que fosse mais crível. A propósito, isso é algo engraçado: as pessoas preferiam ouvir que poderíamos aumentar seus downloads em 20% ao invés de 5x. Soava muito mais credível.

Essa combinação de renomear nosso serviço e tornar nosso portfólio mais modesto nos ajudou a chegar aos nossos primeiros 5-10 clientes.

Mas, em paralelo, também estávamos lidando com outro problema:

 

#3: Fechando nosso primeiro grande cliente

Apesar de termos conseguido vender um punhado de pacotes de lançamento, ainda estávamos longe de fechar clientes maiores que pudéssemos cobrar mais e retê-los no longo prazo.

Além disso, percebemos que estávamos sendo rejeitados porque não tínhamos um grande nome em nosso portfólio (“se ​​os outros não confiam em você, então eu também não posso confiar em você” – niguém falava isso abertamente, mas era óbvio o que se passava). Não ter um nome famoso estava se tornando mais um problema à medida que tentávamos atingir um público maior – e ter mais clientes pequenos era visto como um sinal de que nosso serviço não era diferente de outras estratégias de black hat. Caramba, ainda tinha essa, agora.

Nossa solução foi abrir caminho até um grande cliente para resolver esse problema de uma vez por todas.

A Movile era o nosso alvo. Era de longe uma das maiores empresas brasileiras de aplicativos (ainda é, na verdade), e tínhamos alguns amigos trabalhando lá. Isso era tudo que precisávamos.

Nós os lançamos e negociamos por algumas semanas. Foi o segundo negócio mais difícil que negociamos nesses 2,5 anos. Nosso histórico ainda não era tão impressionante. Mesmo assim, conseguimos fechar o negócio.

Mas esse não é o fim da história. Agora estava a pressão.

Sabíamos que podíamos entregar resultados tremendos para jogadores pequenos, mas não tínhamos certeza se conseguiríamos entregar algo para um jogador tão grande (o aplicativo deles, PlayKids, já estava no top 3 de sua categoria). Este foi nosso próprio teste de competência para entender se estávamos realmente prontos ou não para o que estava por vir.

Afinal, conseguimos aumentar seus downloads em 25%. SIM!

Isso foi mais do que suficiente para construir a história de sucesso que precisávamos. Estávamos extasiados com esses resultados, mas o cliente, nem tanto.

Como eu estava tão desesperado para fechar, concordei em ajudá-los a otimizar algumas páginas de destino para seus anúncios pagos, o que acabou sendo um grande erro. Eu não tinha espaço para trabalhar nisso e acabei sendo demitido pelo cliente por não cumprir totalmente nossa promessa. Foda.

Acabou sendo uma vitória com um gosto meio amargo.

Ainda assim, ter esse business case agora era nosso troféu: nós o destacaríamos em nossa home page, em palestras e apresentações de vendas. A melhor parte: estava funcionando exatamente como pensávamos que faríamos.

 

>> Quer dominar o ASO? Clica aqui. <<

 

#4: Construa uma história de sucesso para cada projeto que já trabalhamos

meu game tem mais dowloads que o seu mug

Nossa caneca favorita

Nossa caneca favorita

Desde então, criando um business case para cada cliente, nos tornamos uma prioridade. Esta foi de longe a parte mais fácil, mas talvez a mais crucial para o nosso sucesso.

Pouco a pouco, começamos a criar cases para todas as categorias de aplicativos disponíveis: transporte, estilo de vida, produtividade, saúde, jogos e assim por diante.

Foi quando as coisas começaram a ficar mais gerenciáveis ​​no lado das vendas.

 

 

#5: Construindo nossa máquina de aquisição

Tínhamos três fontes primárias de leads:

A ferramenta de diagnóstico ASO gratuita em nosso site

Eventos e relações públicas

Boca a boca

Nos primeiros seis meses de operações, nossos leads viriam basicamente de palestras e encontros que realizávamos ou compareciam.

eyso presentation at Intel
Falando sobre ASO @ Intel para Desenvolvedores.

Mesmo depois daquela tração, esta continuou a ser a nossa principal alavanca de crescimento. Acabamos de atualizar nosso jogo: depois de um tempo, recebemos convites para sermos voluntários em incubadoras e no Startup Weekend (um hackathon de fim de semana do Google). Esses eventos seriam preenchidos por pessoas de tecnologia, que nos veriam como uma autoridade na indústria de aplicativos e espalhariam a notícia para suas próprias empresas.

romulo gomes web summit
Eu felizão no Web Summit Dublin (2014).

Eventualmente, conseguimos algumas menções na imprensa, o que acelerou o volante, gerando ainda mais recomendações. Em algum momento, isso se tornou um (bom) problema, com muitas propostas a serem enviadas, obrigando-nos a produtizar nossa oferta e padronizar o preço.

romulo gomes aso entrevista pegn pequenas empresas midia
Menção na Revista Pequenas Empresas, Grandes Negócios sobre Marketing para Apps.

Em paralelo, nossa estratégia de produto foi baseada em uma ferramenta de diagnóstico simples que construímos. Qualquer um poderia acessar nosso site, procurar seus aplicativos, lançar suas palavras-chave e obter um diagnóstico gratuito (depois de fornecer seu endereço de e-mail, é claro).

eyso audit
Exemplo de diagnóstico gratuito Eyso. Era feio, eu sei, mas gerava muita lead!

Não tínhamos tráfego de SEO suficiente, então levamos muito tempo para conseguir tração – como um ano – mas, uma vez que aconteceu, tornou-se uma fonte confiável de leads.

eyso website
A única imagem que encontrei onde você pode ver (parte do) nosso site.

A partir desse ponto, tentaríamos maximizar o quanto poderíamos cobrar com base no tamanho da empresa, o que me leva ao último ponto:

 

6: 10x nosso ticket precificando com base em valor, não em custo

Agora enfrentamos um problema diferente: não conseguíamos atender mais clientes porque não estávamos prontos para escalar.

Foi também aqui que as coisas começaram a ficar um pouco azedas, para ser honesto.

Nosso objetivo nunca foi construir esse negócio de serviços maciço. Queríamos ser um SaaS massivo – era isso que queríamos.

Ainda assim, estávamos obtendo cada vez mais leads para nossos serviços de ASO, mas praticamente nenhum em nossa ferramenta.

Por causa disso, nunca levamos a sério a coisa toda de treinar pessoas. Em vez disso, simplesmente pensamos em como tornar o negócio mais lucrativo para que pudéssemos ter mais dinheiro para investir no desenvolvimento de produtos.

Esse também foi o ponto em que percebemos que alguns clientes estavam obtendo um valor insano de nossos serviços. Em primeiro lugar, porque o ASO se expande bem, mas também porque estávamos aconselhando clientes em outras áreas, como mídia paga, CRO e estratégias de retenção – tornando nosso serviço muito mais sofisticado do que deveria ser.

Nossa nova estratégia de preços era: com base no sucesso de clientes anteriores, projetamos o quanto poderíamos aumentar os aplicativos de nossos clientes.

Cada instalação teria um valor associado a ela que traduziríamos em receita (se o aplicativo não fosse monetizado, calcularíamos quanto poderíamos economizar em aquisição paga para o cliente).

Sabíamos que entregaríamos pelo menos 30% de crescimento em 3 meses, com base no desempenho de clientes anteriores. Até agora, também podemos identificar rapidamente aplicativos com excelente ajuste ao mercado do produto, facilitando muito nossas vidas.

A fórmula ficou mais ou menos assim:

Média de downloads (90 dias) x ASO Target = Downloads esperados

Então, teríamos que descobrir quanto valia uma instalação de aplicativo para esse cliente para ter uma ideia aproximada do valor que entregaríamos. Então nós nos precificamos com base nisso (geralmente em torno de 10-15%).

Então, o que começou em torno de R$ 500, rapidamente se tornou R$ 5.000, chegando a R$ 15.000/mês para um cliente em particular.

Essa foi a última tática que usamos para expandir nossos negócios.

 

O que não funcionou

Também tiveram coisas que não funcionaram, obviamente). Não vou me aprofundar, mas acho que ainda vale a menção:

  • Campanhas de mídia paga
  • Parcerias com agências
  • Parcerias com outras ferramentas de mercado
  • Contratar estagiários para delegar trabalho
  • Expandir internacionalmente

Não que nada disso não funcione, mas não conseguimos fazê-las funcionar no nosso contexto. Eu diria que a maioria delas seria viável com mais esforço, mas como já tínhamos outros caminhos, acabamos seguindo de outras formas.

 

Se estava indo tão bem, por que fechamos as portas?

Como mencionei antes, o que nós queríamos era construir uma plataforma: um negócio SaaS mundial foda. Em vez disso, criamos um negócio de serviços super legal – mas que não era o que queríamos. Então depois de 30 meses, encerramos nossas operações. Mas isso é história para outro dia.

 

 


📕 O que estou lendo

Churn Rate Myths – Reforge: um artigo extremamente necessário sobre os três mitos sobre churn explicados pela galera do Reforge.

Achieve your goals with less grinding: ótimo artigo sobre como sua percepção pode influenciar nosso sentimento de dificuldade em alcançar objetivos. Confesso que tenho me debatido com isso ultimamente, então foi o momento ideal para eu ler este artigo. Não que os problemas tenham desaparecido, mas já me ajudou a refletir melhor sobre eles e colocar as coisas em perspectiva.

“Joyland” do Stephen King: Estou oficialmente desintoxicando de livros de não-ficção neste verão e por sorte encontrei esse livro. Se você curte thrillers e suspense – com uma pitada de romance – esse livro pode ser a sua cara também. Fora que a escrita de Stephen é demais, o cara é uma lenda mesmo, super recomendo.

Como se tornar mais estratégico | NR #3

Quem nunca ouviu essa:

“Eu queria ser mais estratégico/a no meu trabalho”

“Eu quero saber como meu trabalho impacta no resultado. Eu quero entender a conexão entre o que eu faço de tarefa com a performance da empresa. Eu quero me tornar um/a profissional melhor.”

E não está certo?

Quem sabe defender melhor o seu trabalho também consegue oportunidades melhores, convites para projetos legais, promoções, salários mais altos, entre outras coisas.

Portanto, é difícil imaginar alguém que trabalhe com internet e tecnologia que não queira saber exercitar sua capacidade intelectual ao máximo – visto que no fundo é isso o que oferecemos para nossos empregadores, sócios e clientes.

Mas, temos um problemão ali já estamos falando de querer ser alguma coisa. E querer ser é, na verdade, querer se tornar outro tipo de pessoa.

E nesse caso em específico implica em: 

1/ Saber pensar de forma mais estratégica;

2/ O que me leva a ações que são também mais estratégicas;

3/ E, ao repetir os dois, isso se torna tão frequente e natural que agora eu me torno uma pessoa diferente.

É importante ter isso claro porque quando falamos de soft skills não estamos falando de fazer um curso online e partir pra prática. Esse é o motivo, aliás, de ouvirmos o papo de que devemos contratar soft-skills e treinar os hard-skills com tanta frequência. Quem lidera times sabe o quão difícil é ensinar outras pessoas a terem comportamentos e hábitos melhores.É muito mais fácil pegar alguém com bons hábitos e ensiná-las como usar a ferramenta X ou aplicar o framework tal.

O texto abaixo é a minha atual melhor tentativa de colocar no papel como funciona o processo de pensar de forma analítica e estruturada. Está longe de ser uma receita de bolo ou um passo-a-passo infalível: mas espero que a partir dele seja possível tirar algo aplicável para o seu modo de pensar – e agir – no trabalho.

 

Começar com o resultado final em mente

“Faz assim, faz assado. A imaginação vai pelo ralo. (…)
eixa assim, faz igual ao coleguinha do lado que vai ser sucesso”
Robozin – Supercombo

 

Parte 1: Parar de focar em tarefas.

Ao invés disso, vamos focar no que queremos atingir como resultado. Ou melhor, focar no problema que precisamos resolver.

Lembre-se: você quer ser estratégico, o que significa causar um impacto a nível de negócio, e não somente entregar tarefas.

Portanto, questione. Investigue. Pergunte. Não embarque no modo robozinho ainda.

Para isso, vale a pena ter em mente:

O objetivo é resolver problemas.
O objetivo não é entregar o projeto/iniciativa/tarefa.

Essa distinção é chave: é já aqui que as diferenças entre profissionais plenos, sênior e especialistas começam a surgir.

Parte 2: Entender qual o resultado esperado.

Exemplo: minha empresa quer melhorar a taxa de pessoas que se cadastram no meu site, mas que não engajam e nunca mais voltam.

Forma errada de pensar: Bom, meu trabalho é escrever e-mails e push notifications, então vou usar isso e entregar tudo dentro do prazo que vai ser sucesso.

Forma certa de pensar: minha meta é descobrir porque tem pessoas que se cadastram mas não usam o produto – e agir a partir daí, na raiz. Ou, pensando bem, outra forma seria deixar de atrair os usuários errados. Isso também aumentaria a taxa de ativação.

Entende?

De novo: o que você quer é resolver o problema da empresa e do cliente – e não entregar o projeto.

Para isso, comece pelo final, pela compreensão de qual o objetivo. A partir daí você pode trabalhar de trás pra frente para resolver o problema.

Acionáveis deste bloco:

  • Focar no problema a ser resolvido, não nas tarefas;
  • Quando alguém te pedir para fazer algo, pergunte-se: “porque me pediram pra fazer isso? Qual o objetivo final?”
  • Não se deixe intimidar caso a sua solução esteja fora das suas capacidades técnicas ou do seu cargo. Leve esse problema de volta para o seu líder e discuta qual a melhor forma de prosseguir.

 

Colocar no papel

“There’s absolutely no difference between writing and thinking” – Jordan Peterson.

Agora que já está claro o objetivo é hora de colocar o Tico e o Teco para funcionarem.

Não sei se você já notou isso, mas não existe diferença entre escrever e pensar.

Então a melhor forma de exercitar suas capacidades de raciocínio é colocando as coisas no papel.

Fazer isso vai te abrir os olhos para:

  1. Buracos óbvios na sua lógica
  2. A melhor ordem de execução das coisas
  3. Compreensão de como as coisas estão interligadas – ou não
  4. Identificar dependências e tarefas menores que até então não estavam no radar

 

Eu particularmente uso muito o Miro nessa fase – além do Sheets e Docs, dependendo do projeto. Nessa etapa, o objetivo não é ser rebuscado. O objetivo é tirar a ideia da cabeça e colocá-la na sua frente, tornando-se algo estruturado.

Depois, converse com alguém sobre o que você montou, navegando nas suas anotações.

“Mas pra quê isso?”

Sabe quando você passa horas pensando em algo, mas no segundo em que você começa a explicar pra alguém, surgem detalhes novos que você não havia pensado? Então, é isso que a gente quer replicar aqui.

Programadores sabem disso muito bem. Já notou que eles sempre tem um rubber duck em suas mesas? Ou você achou que era só por nerdice? De primeira, isso pode te parecer algo infantil, mas não é: a ideia aqui é que quando você está tentando resolver um problema complexo, explicar o seu raciocínio pro patinho é geralmente a maneira mais fácil de encontrar soluções simples e óbvias.

Legal, né?

Enfim, conversar com alguém com o objetivo de identificar falhas no seu raciocínio vai naturalmente te dar o super poder da autocorreção. Assumindo, é claro, que você de fato deseja isso de forma voluntária – e não fugindo dos seus shortcomings como o diabo foge da cruz. Se esse é o seu caso, começar uma terapia pode não ser uma má ideia.

Pra você entender o quão longe isso vai: a cura através da fala (a tal da psicanálise) funciona pelo mesmo motivo.

Já a

 

explicação neurológica é que existem áreas do seu cérebro que não possuem conexão direta ou vias de mão dupla entre elas. Porém, ao falar ou escrever, essas ligações são criadas, o que desencadeia um raciocínio mais completo e estruturado.

Então na dúvida bota pra fora, pro papel, ou pro divã.

 

Acionáveis deste bloco:

  • Passe a colocar suas ideias no papel antes de começar a executá-las;
  • Discuta as suas ideias com outra pessoa, qualquer pessoa;
  • Construa o hábito de se autocorrigir.

 

Mensuração e expectativas primeiro, execução depois

Ainda não é hora de pôr a mão na massa. Mas calma, a gente tá chegando lá!

Depois de colocar tudo no papel e discutir com alguém eu penso:

“Ok, deixa eu me colocar no futuro agora. Imagina que já está pronto e já está tudo lançado. E agora? O que acontece?”

A resposta, na minha experiência, é algo tipo: “bom, agora vou precisar mensurar os resultados para saber se está dando certo ou não.”

E você quer fazer isso não só porque alguém te pediu. Não só porque a meta tem que ser batida: mas para você mesmo.

Para você saber se aquilo que você criou está cumprindo o propósito que deveria, ou não. Isso é o que mais importa. Dando certo, ou dando errado, você tem que conseguir ligar os pontos e saber explicar o que aconteceu.

Vamos dizer que o meu projeto era criar uma trilha de onboarding para meus usuários através de emails e push notifications.

Antes de pôr a mão na massa, eu penso:

  1. Como eu posso saber se essa trilha está dando ou não resultado?
    1. Posso observar se quem interage com as minhas mensagens está de fato usando mais o produto ou não.
  2. E como eu meço isso, exatamente?
    1. Posso colocar como conversão o engajamento dos usuários em determinadas funcionalidades que sei que são importantes.
  3. Como posso saber que de fato é a minha iniciativa que está causando esse efeito e não alguma iniciativa de outro time, sazonalidade ou fatores externos?
    1. Dá para usar um grupo de controle. 10% dos meus usuários não vão receber minha trilha, com isso vou ter uma referência de comparação para o meu resultado.
  4. E qual pode ser o impacto no negócio?
    1. Bom, nós temos 1,000 cadastros por dia, e sei que desses, 600 nunca voltam depois do primeiro dia. Se eu conseguir recuperar 100 desses todo dia, no final terei gerado 3,000 usuários engajados a mais para o negócio.
  5. E quanto isso gera de receita?
    1. Bom, um usuário engajado fica com a gente durante 2 anos e o pessoal de Dados fez um estudo de que eles gastam em média R$2.000 no seu lifetime. Então o impacto da minha iniciativa é usuários*lifetime value.
  6. E qual o custo de implementação?
    1. Eu devo passar umas duas semanas fazendo isso. Devo também tomar uns quatro ou cinco dias de outras pessoas do nosso time. Então o risco aqui é não conseguirmos retornar esse investimento de tempo e o custo de oportunidade disso.

 

Com o tempo, ao fazer esse exercício regularmente, você começa a comparar mentalmente diferentes iniciativas e entender quais deve priorizar e quais devem ter o maior impacto. É como andar de bicicleta: das primeiras vezes você tem que se concentrar muito, pensar em cada movimento do seu corpo. Mas depois que aprende e o hábito é criado, naturalmente essas perguntas vão te vir à mente.

O legal é que as respostas que você se deu vão ser a sua linha de referência agora. Durante a execução, você vai comparar a performance real do projeto versus a sua expectativa. A diferença entre as duas é o quão boa a sua predição foi.

Exemplo: “imaginei que ia conseguir resgatar 100 usuários por dia, mas na verdade só consegui 50”.

Por você ter feito esse exercício, agora é óbvio se aquilo está tendo o resultado esperado ou não. 

Pronto, agora você já sabe: o que medir, como medir, qual o impacto no negócio, e como saber se as coisas estão indo na direção desejada.

 

Acionáveis deste bloco:

  • Tenha claro como medir o impacto do que você vai executar;
  • Entenda qual o desdobramento para o negócio;
  • Saiba quais são os riscos;
  • Mantenha isso em mente durante toda a execução.

 

O pulo do gato

Aqui é a parte que a galera do 100% data-driven trava o playstation.

Lembre que: dados te dizem o que está acontecendo, mas não o porquê – e muito menos o que deve ser feito sobre o problema.

Para facilitar, vou continuar aqui o exemplo de que eu sou a pessoa que precisa criar uma trilha de onboarding para melhorar a ativação do meu produto.

1/ Seu analytics vai te informar o “o quê” está acontecendo:

  • [essencial] Open rates, click rates e unsubscribe;
  • [básico] Taxas de conversão;
  • [avançado] Resultados do grupo controle vs grupo tratamento*;
  • [pro] Impacto no funil do produto;
  • [lendário] Impacto nas curvas de cohort e growth loops.

*grupo tratamento: grupo de usuários impactados pelos meus emails e pushes.

Com essas métricas você pode saber o que está acontecendo e aonde na jornada estão os problemas e oportunidades. Mesmo que você esteja só no básico, é possível ter esses insights.

2/ Já suas pesquisas, feedbacks de clientes, e dados qualitativos vão te dar indicações do que pode estar motivando o resultado:

  • Screen recording, heatmaps e afins;
  • Relatórios de bugs e erros
  • Análise de sazonalidade
  • Feedback de usuários

Daqui saem as hipóteses de por quê seus usuários estão ou não respondendo à sua iniciativa.

3/ Por último, só a sua capacidade de pensamento crítico pode encerrar esse processo e definir o como:

  • Listar hipóteses
  • Debater essas hipóteses com outras pessoas do time
  • Validar essas hipóteses para fechar o loop

Responde: qual a hipótese mais provável de solução do problema e como levá-las adiante.

Então, resumindo:

  • O analytics te dá a visão do o quê;
  • Dados qualitativos te dão as hipóteses dos porquês;
  • E o seu julgamento infere o como.

 

 

Estudo de Caso de Lifecycle – Airbnb | disponível no YouTube

LANÇAMENTO: Kit de contratação de Lifecycle

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Quer trabalhar comigo?

A iClinic está com essa vaga de Analista de Lifecycle Senior. Acha que tem tudo a ver com você? Manda o currículo 🙂
Sou consultor na Afya portanto tenho contato semanal com o time da iClinic, vai ser um prazer trabalhar contigo!

 

O que estou lendo


Case Duolingo: “Hi, it’s Duo”: Meet the AI behind the meme
O time do Duolingo publicou esse artigo super legal mostrando um pouco dos bastidores de como eles escolhem quais templates vão mandar para os seus usuários. É uma leitura curta, vale a pena.

 

Cashversiting do Drew Eric Whitman
Peguei essa dica numa entrevista do Justin Welsh sobre copywriting e estou achando o livro muito bom, cheio de dicas acionáveis e exemplos. Como tenho escrito muito, tem sido um prato cheio.

 

ps: obrigado a todas as 162 pessoas que se inscreveram nessa news desde a semana passada. Fico feliz de ver tanta gente entrando, dando feedbacks, sugestões e recomendando a outros amigos.

 

Essas primeiras semanas devem continuar a ser de muita experimentação e papos individuais para pegar as percepções de vocês.